Ao escutar o poema “Se eu fosse eu” da espetacular Clarice Lispector, dei-me por conta da excitação em que vivo por experimentar ser eu mesma. Claro que há oscilações de personalidades mil que acumulamos através dos tempos e encaixamos nos padrões culturais ou nos diversos papeis do grande “palco da vida”, como diz Augusto Cury. Porém, me pergunto: e daí? Viver a coragem de ser o que se é parece ser mais complexo do que podemos imaginar. Posto que, para vivenciar esta vida nova, precisamos saber primeiro quem somos. E quem somos nós? O que somos?
Um conjunto físico a formar o corpo humano é básico em resposta superficial da área biológica. Entrar em questões atômicas e/ou quânticas, não responderia, neste primeiro momento, a questão. O que quero dizer, em resumo, é que, corpo e espírito não são suficientes para quantificar qualitativamente, reações e posicionamentos diante do eu.
Uma amiga uma vez me disse, sobre um colega de trabalho seu que dizia “mentir adoidamamente” para seu psicólogo. Logo eu- e minha mania de analisar as coisas (fruto de uma formação em planejamento – desculpas válidas, não?!)- significaria o fato como perda de tempo do paciente, ou tese de mestrado para o doutor da mente em linguagem, que dariam pistas do que realmente se mostra como verdade. “Meta mentira” = uma mentira da mentira. Pensamentos sórdidos e/ou nonsenses passam por nossas imperfeitas cabeças. Divergem-se de nossos padrões sociais, e/ou valores e princípios, nos causam repulsa. Quando não, formam delinqüentes, pervertidos, serial killers, suicidas.
Há, em minha opinião, uma saída (Ok, ok! Para os especialistas podem haver várias!). A da coragem: assumir imperfeições não é para qualquer um. Quando se tornam latentes, a ajuda primeira é a pessoal: é hora da verdade. Se não tem coragem para contar para você mesmo, conte para seu espelho. Permita-se liberar os pensamentos que te aprisionam e se fazem prisioneiros. Se colocá-los no banco dos réus (os sentimentos, não você!), qual seria a condenação? Com que critérios iria julgá-los?
Sentir é natural. O que se sente, seja lá o que for, faz parte. Seja bom, ou ruim. A atitude e comportamento que se tem diante de tais sentimentos são o que fazem a questão. Se você fosse apresentado a você mesmo, diria “Muito prazer em conhecê-lo”?
Quando contava, neste tempo, meus 13 anos (Ai que saudade daquele tempo!), tive a oportunidade de conhecer as obras de Salvador Dali, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. “Cara muito louco!” pensei à época. Hoje, para mim, diante de tais quadros e esculturas, respiro profundamente e encantada: “Gênio das possibilidades”. Artista do surrealismo – sempre me lembrarei das aulas de literatura e seus movimentos – o que não tem lógica é retratado. Um tigre a sair da boca de um peixe, que sai da boca de uma romã (Bem, acho que é uma romã!), uma mulher com gavetas a sair do corpo, borboletas como velas de um barco, ou caravela... O que é possível sonhar? O que é possível se expressar pela arte, colocando a mente na tela através de tinta a óleo diversas?
Voltando à "vaca fria", o que sairia da sua mente se seus segredos mais íntimos- tão íntimos que nem se permite pensar- fossem retratados em tela? Mais referências de jardins ou de sertões? Mais referências de campos verdes, ou de campos de guerra? Quem é você? Concluindo, como Gal a cantar: “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que se é”. Deguste-se e torne-se seu melhor amigo; cúmplice de você mesmo. Conte-se seus segredos e: tenha um enorme prazer, em se conhecer.
Lívia Suhett